Ariane sempre me
surpreende. Quando eu menos espero, tchan-ran!, ela me aparece com
mais uma. Dessa vez, logo que acordei, sobre o embaçado dos meus
olhos, estava Ariane de frente para o espelho, claramente feliz, com
as lindas asas que lhe nasceram. Disse que foi durante a noite.
Ela mandou que me apressasse, porque agora precisávamos de um novo
lar, maior e mais confortável. Que um novo fruto colheria. Ela
precisava voar. Confesso ter ficado um tanto confuso com aquilo tudo:
talvez com tantas asas, perca-se um pouco da humanabilidade. Mas não
com Ariane. Ela estava convicta e merecidamente linda. Só vendo.
Ela me disse que agora
pode voar. Sentir o vento bater nos olhos. A chuva queimar. Pousar
sobre a flamboyant que a gente vê daqui de casa, confundi-la com
suas novas cores. Que agora sua liberdade não tem mais aspas.
Danadinha a Ariane! Sabe tudo. Sabia de tudo o tempo todo. Espera
sempre a hora certa para falar. Todo aquele suspense da última
semana me deixou assustado. Mas ela me confortou, dizendo para eu não
me preocupar, porque só almas gêmeas ficam em silêncio sem
constrangimento. Como eu aprendo com Ariane! Só ela faz de um
canteirinho de plantas na varanda, sítio. De um feixe de luz, ocaso.
E de qualquer asas, liberdade.